No dia 24 de fevereiro de 1932, o presidente Getúlio Vargas finalmente assinou o decreto que sancionava o direito de voto para as mulheres no Brasil. Mas não sem ressalvas: poderiam votar apenas as mulheres casadas, autorizadas pelo marido, as viúvas e as solteiras cuja renda viesse de seu próprio trabalho. Apenas em 1934 estas limitações cairiam por terra.
Uma das protagonistas destes anos de mudanças foi Antonieta de Barros, primeira deputada negra eleita no Brasil. Nascida em Florianópolis, em 1901, Antonieta era filha de uma lavadeira e era órfá de pai. Formou-se, em 1921, professora de Português e Literatura – um dos poucos cursos que aceitava mulheres na época -, e ministrou aulas de alfabetização para a população carente.
Na década de 30, Antonieta se aproximou dos debates sobre direitos civis, sociais e políticos, particularmente a defesa do direitos das mulheres ao voto. Com uma campanha que a colocava como insígnia das mulheres catarinenses, foi eleita deputada em 1934, sobrevivendo ao racismo, machismo e opressão de classe.
Segundo Karla Nunes, autora da Dissertação de Mestrado intitulada “Antonieta de Barros – Uma mulher negra no círculo do poder político em Santa Catarina nas décadas de trinta a cinquenta”, Maria da Ilha (pseudônimo que usava em suas crônicas de jornal) sabia que o afastamento da mulher no âmbito político não representava um fato “natural”, como grande parcela das mulheres acreditava, e sim se devia a fatores culturais como o machismo presente na sociedade. E era provocativa: “Que seremos nós, as mulheres? Irracionais ou domesticadas? Porque esta questão de inteligência e aptidões femininas, ora em foco, se resume, digamos de passagem, em classificar a mulher entre as criaturas superiores ou entre os irracionais […]. É isto que está agonizante e querem reviver […]. Inferior aos próprios irracionais, doméstica e domesticada, se contentará, eternamente em constituir a mais sacrificada metade do gênero humano?”(1).
Hoje, 84 anos depois desta conquista, as mulheres são maioria no número de eleitores (52,13% nas eleições de 2014 [2]), mas ocupam apenas 9,9% dos cargos na Câmara dos Deputados e 13% no Senado Federal (3). Estes números colocam o Congresso Nacional em 116º lugar em um ranking de 190 países. A participação feminina na vida política do país tem aumentado gradativamente desde a Constituição de 1988 e a Lei das Eleições de 1997 (que previa cotas nas candidaturas, fundo partidário e tempo de propaganda gratuita), mas as disparidades de gênero que se perpetuam na sociedade – desde muito antes de Antonieta de Barros – dificultam, e muito, uma participação igualitária. A dupla jornada – trabalho formal e trabalho doméstico -, por exemplo, é uma das grandes ameaças à participação das mulheres na política, seja em partidos, sindicatos ou movimentos sociais. Dados da Síntese de Indicadores Sociais (SIS) do PNAD/IBGE, mostraram que, em 2013, 88% das mulheres trabalhadoras com 16 anos ou mais realizavam afazeres domésticos, enquanto que entre os homens este percentual era de apenas 46% (4).
Comemorar os 84 anos da conquista do voto feminino no Brasil é necessário. Manter viva a história das mulheres, como Antonieta de Barros, que protagonizaram a inserção da mulher na política, também. Mas, para além disso, a realidade continua a chamar todas para a luta, para as ruas e para os espaços políticos: há muito a conquistar!
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Texto – Comunicação Fisenge